O que é uma família?

Nos últimos dias temos sido bombardeados com notícias sobre a aprovação do Estatuto da Família em comissão especial da Câmara dos Deputados. Esse Estatuto define a família como a união entre homem e mulher por meio de casamento ou união estável, ou a comunidade formada por qualquer um dos pais junto com os filhos.
Obviamente essa definição está causando uma grande revolta dentro da comunidade LGBT, pois deixa de fora casais homossexuais e seus filhos. Mas além disso, essa definição deixa de fora uma grande quantidade de arranjos familiares existentes no Brasil. O último censo de 2010 já destacava mudanças nesses arranjos, mostrando inclusive uma queda acentuada no percentual de famílias que se enquadravam como o arranjo tradicional (mãe, pai e filhos), representando 54% do total.
Com essas dados já se tem uma noção de que essa definição é bastante retrógrada e não reflete de fato o que está acontecendo na sociedade brasileira atual. Isso se deve em partes pelo fato de que grande parte dos participantes da comissão são provenientes de legendas representantes de interesses religiosos, também conhecida como “bancada evangélica”. Acreditam que devem impor seus valores pessoais e religiosos à sociedade como um todo, esquecendo que o Estado é laico.
Há alguns argumentos de que a definição de família não influencia em nada, pois as pessoas poderão continuar se juntando e constituindo suas famílias do modo que desejarem, uma vez que o Estatuto não proíbe outros arranjos. Realmente, não há nenhuma proibição em outros arranjos, mas a definição influencia sim em muitas situações. 
Influencia basicamente em direitos, muitos deles. Pensemos no caso de falecimento dos pais: seus filhos poderiam em determinados casos receber pensão ou seguros. Mas se ao invés de filhos, estes fossem enteados? Se não são considerados família como teriam direito a tais benefícios, ainda que fossem tratados como verdadeiros filhos? Colocar um enteado no plano de saúde familiar? Nem pense nisso, ele não é da família. E podemos enumerar uma série de direitos que se vão como essa “simples definição”. 
Além de se ferir a liberdade das pessoas, o que quase ninguém tem percebido é que esse estatuto também é uma boa forma para sorrateiramente tirar direitos de uma grande quantidade de pessoas. Ou seja, mexer no que se “constitui” como família, que é tida como base da sociedade, é “desonerar” o Estado e as empresas de certas “obrigações” que recaem nelas por causa das famílias. No final de tudo, a questão é também financeira, e se bobear mais que ideológica. 
Além de se enxergar família como um núcleo constituído pelo afeto entre as pessoas, ela é também um núcleo econômico, no qual se alcança uma melhor eficiência do que se morar sozinho por exemplo. E como muitas coisas no mundo capitalista giram em torno do dinheiro, não ia ser diferente com a questão da família. Mexer na família é mexer com o capitalismo também. Pode parecer viagem, mas infelizmente não é tanto assim…
Quero acreditar que esse Estatuto não vai ser aprovado no Senado, porque é demasiadamente excludente em sua definição. Mas vamos acompanhando as cenas do próximo capítulo dessa novela para ver o desfecho.

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