Mulheres na computação IV

Já fiz alguns posts nesse blog falando da perspectiva feminina na computação (vejam os posts Mulheres na computação, Mulheres na computação II, Mulheres na computação III e Preconceito com mulheres na computação).

Dia 8 de março foi o Dia Internacional da Mulher. Esse dia é considerado um dia de luta pela igualdade de gênero. Por isso, gostaria de propor uma reflexão sobre o papel e a atual situação das mulheres nas carreiras ligadas à computação. 
 Hoje vemos que temos poucas mulheres fazendo cursos, seja técnico ou superior, e seguindo carreiras nas áreas da computação. Há que diga que isso se deve a uma “fator biológico”, alegando que as mulheres tem mais aptidão para as áreas humanas. Mas nem sempre foi assim. No início da história da computação houve um protagonismo feminino, o que pode refutar em certa medida essa hipótese. 
De acordo com Lubar (1998:25) apud Schwartz et al. (2006), quando os primeiros computadores começaram a ser utilizados parecia óbvio que esta seria uma área feminina, uma vez que as mulheres tradicionalmente realizavam a atividade de “computar”, realização de cálculos para os cientistas. Assim, seria natural que elas continuassem a realizar essa atividade, agora com a ajuda dos computadores. Por isso, muitas das pioneiras, além de serem mulheres, eram formadas em matemática e ciências, com doutorado em matemática. 
O início da computação já começa com uma grande pioneira, Ada Byron ou Condessa de Lovelace. Na época em que ela viveu (1815-1852), também vivia um outro grande contribuinte no desenvolvimento da computação, o cientista Charles Babbage, que é tido como o pai dos computadores modernos. Ada conheceu o trabalho de Babbage e, traduzindo uma de suas teorias, acrescentou notas nas quais descrevia como alimentar a máquina analítica de Babbage com cartões perfurados, sendo tidas como os primeiros programas de computadores. Ada também previu a possibilidade da música computadorizada, afirmando que a música é matemática e, portanto, poderia ser adaptada para ser composta por uma máquina. Portanto, sua grande contribuição para a história da computação é ter sido a primeira pessoa a descrever completamente o processo que hoje é conhecido como programação de computador. 
Uma outra pioneira na história da computação foi a Grace Hopper (1906-1992). Ela se graduou em 1928 como bacharel em Matemática e Física  no Vassar College e, em 1930, conclui seu mestrado na Yale University. Em 1934, também na Yale University, ela conquistou seu Ph.D. em Matemática. Depois tornou-se professora de matemática no Vassar College. Em 1943, Grace tirou uma licença de Vassar e foi empossada na Marinha dos Estados Unidos como analista de sistemas. Em 1949, Grace Hopper tornou-se empregada da corporação Eckert-Mauchly Computer como matemática  e participou da equipe de desenvolvimento do UNIVAC I. No começo dos anos 1950 foi o período em que desenvolveu o primeiro compilador de computadores, que é um programa que traduz o código fonte de uma linguagem de programação de alto nível (linguagens comumente usadas pelos programadores, como o Java) para uma linguagem de programação de baixo nível (linguagens que são entendidas pelas máquinas, como por exemplo o Assembly). Com essa ideia de um compilador, ela influenciou a criação da linguagem COBOL, que seria uma linguagem de programação de alto nível e mais próxima à linguagem humana, facilitando a programação e remodelando essa atividade para os moldes atuais.
 
E esses são apenas dois exemplos do protagonismo feminino nas áreas de computação. Na figura abaixo há mais alguns exemplos:
 

Porém, hoje a realidade tornou-se bem diferente do início da computação, época na qual a maioria dos profissionais e estudantes de computação eram mulheres. Hoje vemos uma baixa procura de mulheres pelas carreiras de computação, em especial a engenharia, há uma desvalorização da mulher no mercado de trabalho e aquelas que se formam na área acabam ao longo da carreira migrando para outras áreas, como gestão e administração. A problemática pode ser ilustrada através da tabela abaixo, que foi feita pelo Trampos.co, um site para busca de empregos. Apesar de não ser uma pesquisa formal e sim apenas na base de dados dos profissionais cadastrados nesse site, ela mostra bem as porcentagens discrepantes entre os gêneros nas áreas de tecnologia da informação e programação. Ainda mostra um dado alarmante sobre a questão da pretensão salarial, que talvez seja uma pista do porquê as mulheres ganhem menos que os homens exercendo o mesmo cargo. No geral, as mulheres tem uma pretensão salarial menor do que as do homens, chegando a casos extremos como em programação.

Lógico que o mundo não é só desgraça. Tem muita gente já preocupada com esse cenário e se mexendo para mudá-lo. Há cerca de um mês atrás fui em um evento no Google chamado Women in Technology, em que foi discutido esse cenário preocupante. O Google tem sérias dificuldades em contratar mulheres para as suas áreas técnicas devido a baixa quantidade de candidatas e promoveu esse evento de certa forma para pensar em conjunto no que pode se feito.
A última edição da Info Exame, conhecida revista da área de computação trouxe uma matéria sobre mulheres envolvidas na tecnologia e computação. A capa não poderia ser melhor mote para o movimento: “Tecnologia é coisa de mulher”!!!
  
Na matéria são expostas duas iniciativas que posso falar um pouco por experiência própria. O primeiro é a RodAda Hacker, cujo nome foi dado em homenagem à Ada Byron. A RodAda é uma oficina de programação voltada para meninas e mulheres. A ideia é que os tutores (de preferência mulheres) conduzam as meninas ao aprendizado do assunto de seu interesse na área da computação, seja construção de seu próprio site, a criação de algum aplicativo para celular ou que mais a imaginação permitir. Em uma das edições do ano passado tive o prazer em atuar como tutora e posso dizer que é bom ver todo esse processo de construção da autonomia das mulheres.
Outra iniciativa interessante é o Technovation Challenge, que é uma competição global de empreendedorismo tecnológico voltado apenas para meninas do Ensino Médio. As meninas devem formar equipes de até 5 participantes (todas meninas) e tem apenas 3 meses para desenvolver uma aplicativo para celular e um plano de negócios. Os grupos devem possuir uma mentora mulher. No ano passado, apenas um grupo do Brasil participou e ficou em terceiro lugar. Esse ano há bem mais grupos brasileiros participando (ainda não há uma estatística oficial) e eu estou atuando como mentora como um desses grupos.<
A ideia dessas iniciativas não é a de promover a segregação entre os gêneros, fazendo com que os homens não possam participar, mas sim criar um ambiente “seguro” e “confiável” para o protagonismo feminino, sem os medos típicos em que os espaços compartilhados geram nas mulheres.
Com esses fatos expostos gostaria de deixar aqui algumas questões que estão ainda em aberto na minha cabeça e acredito que necessitem de respostas para que o cenário atual se altere de forma a representar a real diversidade de pensamento da sociedade e para que sejam construídas tecnologias relevantes para mais gente:
  • Como motivar mais mulheres a seguir carreiras nas áreas de computação, em especial na engenharia?
  • Como tornar os mercados de computação mais atrativos para as mulheres?
  • Como valorizar mais as mulheres no mercado de engenharia e de computação?
  • Por que as mulheres tem menor pretensão salarial que os homens?
  • Por que as mulheres perderam espaço no mercado de trabalho em computação considerando seu papel pioneiro em seu início?

E com essas perguntas eu encerro meu texto, esperando que comentários possam me ajudar a esclarecer essas questões…

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